segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Dano moral sofrido pela vítima pode atingir terceiros

* Por Flavia Romano

Há na jurisprudência dos tribunais do país consenso acerca da legitimidade para ação indenizatória àquele que tiver sofrido um dano. Indaga-se, todavia, se haveria uma limitação quanto aos ofendidos para pleitearem um ressarcimento por dano reflexo ou indireto. No julgamento do REsp 1208949, do qual foi relatora a eminente ministra Nancy Andrighi, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que os pais têm legitimidade para pleitear indenização por dano moral concorrentemente com a filha: “Reconhece-se a legitimidade ativa dos pais de vítima direta para, conjuntamente com essa, pleitear a compensação por dano moral por ricochete, porquanto experimentaram, comprovadamente, os efeitos lesivos de forma indireta ou reflexa”.

Na motivação do voto a ministra fez constar que “são perfeitamente plausíveis situações nas quais o dano moral sofrido pela vitima principal do ato lesivo atinja, por via reflexa, terceiros, como seus familiares diretos, por lhes provocarem sentimento de dor, impotência e instabilidade emocional.”

Com efeito, apesar de o legislador de 2002, no artigo 948, na hipótese de homicídio, não excluir o pagamento de indenização devido a “outras reparações”, manteve aberto o impasse acerca da legitimidade para a indenização a terceiros por danos morais. A dificuldade da reparação por dano moral, que assume também o caráter de pena privativa, advém da necessária ponderação da intensidade do vínculo afetivo entre vítima direta e terceiro. Em se tratando de pais, cônjuges, filhos e avós, o vínculo afetivo se verifica com relativa segurança, mormente se nada existir que possa afastar esta presunção. A preocupação, ao revés, se intensifica quando o pleito decorre de parentes distantes, amigos íntimos, noivos ou namorados.

O professor Sérgio Cavalieri Filho adverte quanto à impossibilidade de adoção de critérios absolutos para se determinar de antemão a legitimidade ativa no dano moral indireto: ”Um parente próximo pode sentir-se feliz pela morte da vítima, enquanto o amigo pode sofrer intensamente.”

Nesse sentido, apenas o caso concreto poderá revelar com alguma margem de certeza se o demandante realmente sofreu o dano e qual o vínculo afetivo existente.

Registre-se o julgamento dos Embargos Infringentes 0133034-93.2005.8.19.0001, da qual foi relatora a eminente Desembargadora Letícia Sardas, 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no qual se decidiu pelo provimento do pedido indenizatório dos tios da vítima por danos morais: “Embargos Infringentes. Ação indenizatória. “Chacina da Baixada”. Ponto Controverso apenas com relação à existência de dano moral em face do tio e da tia da Vítima. Indenização Devida. Desprovimento dos Embargos Infringentes. “... 3. Ocorre o dano em ricochete toda vez que outra pessoa é atingida indiretamente pelo ato ilícito causador do dano. 4. Os tios da vítima pleiteiam apenas os danos morais e não há como aderir à tese dos presentes embargos infringentes da inexistência de maior vínculo afetivo entre eles.”

Há ainda diversos julgados reconhecendo a legitimidade ativa de irmãos da vítima quanto ao pleito indenizatório. Neste sentido, acórdão recente de relatoria da eminente Desembargadora Teresa de Andrade Castro Neves, na Apelação Cível 0061604-42.2009.8.19.0001, do TJ-RJ: “O dano moral é direito personalíssimo, inserido na esfera individual de cada titular. O evento danoso é único, porém o dano que este causa repercute na esfera de vida de uma gama de pessoas eventualmente envolvidas ou ligadas àquela vítima. Dano Ricochete. Não podem os irmãos ser considerados ilegítimos titulares do dano sofrido com a morte precoce, violenta e inesperada do outro irmão, tão-somente porque outros parentes foram indenizados. Caberá ao julgador equilibrar a quantificação do dano quando do arbitramento do valor indenizatório e não afastar friamente o dano efetivamente sofrido com a trágica morte de um ente amado”.

Por derradeiro, apesar de vozes dissonantes na doutrina, a tendência jurisprudencial, especialmente em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana - artigo 3º, inciso III, da Constituição de 1988 -, é a de considerar desnecessária a prova do dano moral diante da presunção lógica de ligação afetiva intensa entre a vítima direta e o parente próximo. Como é cediço, o dano moral, enquanto mecanismo de reparação de lesão a direitos da personalidade, não se substitui pela equivalência monetária da dor ou do sofrimento causado – o que nem mesmo faria sentido -, mas aparece como um meio de atenuar o prejuízo imaterial constatado no caso concreto, aferido por parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem-se firmando, todavia, no sentido de estabelecer um limite para a indenização por danos morais nos casos de morte de pessoa da família, em cerca de 500 salários mínimos (RESP 278885 / SP; RESP 139779 / RS; RECURSO ESPECIAL 1997/0047933-1; RECURSO ESPECIAL 1993/0034264-9). Mas, sem embargo das referidas decisões, a doutrina vem se posicionando no sentido de exigir cautela às circunstâncias individuais que reclama o caso concreto. In casu, o professor Gustavo Tepedino aduz em Código Civil Interpretado Conforme a Constituição da República que o “parâmetro, todavia, deve ser flexibilizado de acordo com as circunstâncias concretas do caso e as condições pessoais daquele que pleiteia a indenização – não a sua capacidade econômica, mas a natureza da sua relação com o de cujus”.

Finalmente, no tocante à limitação do número de legitimados ativos para a demanda, o eminente Desembargador André Gustavo C. de Andrade da 7ª Câmara Cível do TJ-RJ in "Estudo Sobre a Evolução do Dano Moral", publicado na Revista da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro 24/141, acrescentou que “a cada legitimado à indenização por dano moral deverá tocar uma verba independente, correspondente à dor e à perda de cada um para a obtenção de reparação pelo dano moral sofrido. Não há, em tal situação, um único direito à postulação da reparação pelo dano moral, mas tantos direitos quantos forem aqueles que tiveram a sua esfera moral ou ideal atingida reflexamente pela morte do ser querido”.

Diante do que aqui se expôs, pode-se afirmar a necessidade da proteção de um invólucro fundamental da dignidade humana, vigiada pelos contornos do caso concreto, conquanto se exteriorize a lesão reflexa entre a vítima direta e a indireta.

* Flavia Romano é advogada

Fonte: Conjur

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

As oportunidades no Novo Brasil e os cuidados fundamentais na aquisição e venda de empresas

* Paulo Egídio Seabra Succar

Ultimamente tenho repetido como um mantra um discurso que cada vez tem me feito mais sentido. Sustentado por fatos tenho constatado junto a amigos e clientes que o Brasil vive seu melhor momento econômico de todos os tempos. E seguirá assim pelo menos até os eventos Copa do Mundo em 2014 e Olimpíadas em 2016. Com isso me parece que a economia reagirá bem, e o único risco será uma inflação de carestia, de falta de mercadorias. Nem mesmo as novatadas do Governo Dilma tirarão esse grande arranque do Brasil. Talvez pudesse ser melhor, mas ainda assim vai ser muito bom.

No ambiente empresarial, minha experiência aponta para certa tranquilidade nos negócios. Não temos percebido abalos na liquidez dos agentes. O mercado consumidor está absolutamente comprador, especialmente de produtos de baixo valor agregado. E, como é de se esperar em tempos de mercado aquecido e muito dinheiro disponível, as oportunidades de reorganização societária surgem como milho de pipoca em óleo quente. Nesse âmbito, tenho assistido e atuado em muitas tentativas e concretizações de fusões, aquisições, associações, joint ventures, investimentos de fundos de private equity e venture capital e uma infinidade de outras modalidades de aproximações empresariais. Também tenho notado uma intensificação sem precedentes no movimento de estrangeiros instalando-se no Brasil. E em todos esses casos, não me refiro a grandes companhias transnacionais. Essas já estão no Brasil desde o Governo FHC. Agora é a vez das pequenas e médias empresas, o chamado middle market.

Porém, assim como os tempos de crise são identificados como oportunidades, os de excesso de oportunidades podem ser problemáticos se não foram bem administrados. E é aqui que deixo meu maior conselho aos meus leitores: escolham suas oportunidades. Cerquem-se de informações. Aconselhem-se. Primeiro, ao oferecer ou ao ser assediado por algum interessado no seu empreendimento, tenha sempre em mente o roteiro 'non disclosure agreement, memorandum of understanding e due diligence'. (nas siglas em inglês NDA - MOU – DD)

O primeiro deles é um compromisso de sigilo. O segundo um entendimento sobre as possibilidades de associação empresarial. É, na tradução ao pé da letra, um memorando de intenções. E, caso se alcance o terceiro estágio, já estaremos na famosa due diligence, ou seja, a fase das auditorias, momento no qual se revelarão todas as intimidades das sociedades envolvidas na operação.

A adoção desse trâmite (NDA, MOU e DD), tem diversas vantagens para as partes envolvidas no arranjo que se pretende alcançar. O negócio terá a sua maturação no tempo certo, as partes se conhecerão mais em essência, os temas a serem enfrentados nas negociações surgirão de forma natural e ordenada e assim todo o processo será melhor estruturado para uma conclusão satisfatória.

Das três etapas dessa reorganização societária almejada pelas partes, as duas primeiras (non disclosure agreement e memorandum of understanding) exigem mais transpiração das partes envolvidas e menos dos seus assessores. Na terceira, o suor será dos profissionais envolvidos no exame das situações legais das sociedades. Nessa fase haverá a due diligence fiscal-tributária, trabalhista, societária, imobiliária, a-m-b-i-e-n-t-a-l (vocês não imaginam, meus caros leitores, como as exigências ambientais se agigantaram nestes últimos tempos, mesmo para as pequenas e médias empresas!). Você pode desconhecer, mas certamente sua empresa está sujeita a alguma norma ambientalista. Procure e confirmará!

As questões tributárias e trabalhistas também preocupam bastante, ou devem ser foco de muita atenção das partes.

As tributárias por conta de uma característica das sociedades brasileiras: quase todas elas são familiares e, como as famílias tendem a deixar "tudo em família", criam contingências tributárias enormes que, muitas vezes inviabilizam a operação. Essa situação deve ser bem avaliada pelas partes envolvidas. Alguns assessores, sem razão nem porquê, sugerem estruturas societárias irreais, sem fundamentos fáticos, ou recomendam utilizar sociedades off shore. Para isso há seu tempo, hora e lugar. E uma sociedade off shore tem muitas limitações em funcionar no Brasil se forem constituídas nos chamados "paraísos fiscais". Os paraísos fiscais são assim chamados porque são jurisdições de baixa tributação ou onde há sigilo societário. Apesar do Brasil não integrar a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a qual recomenda discriminação fiscal nas relações com empresas nas jurisdições denominadas "paraísos fiscais", editamos entre nós legislação que penaliza pagamentos de rendimentos a pessoas domiciliadas em jurisdições ou dependências em que a tributação é inferior a 20% (caso do Estado de Delaware) ou em que há sigilo societário (caso das Ilhas Virgens Britânicas, facilmente constituídas a partir de Miami, EUA).

As trabalhistas por conta da obtusidade de campeia na justiça laboral. Dia desses ouvi de um juiz do TRT da 2ª região que "em matéria de fraude a credor, meu entendimento é o mais amplo possível: se há ação trabalhista e houve alienação de patrimônio, há fraude" (sic!). Lamentavelmente são entendimentos dessa natureza, desprovidos de senso jurídico, que tornam os assessores ainda mais imprescindíveis, e os cuidados com esses arranjos societários ainda mais cautelosos.

A avaliação do risco ambiental também tem merecido muito destaque em razão do avanço da legislação brasileira nesse sentido. Temos experimentado padrões legais ambientais bastante rigorosos. Na nossa experiência podemos citar um caso relativamente simples de descarte de resíduos por rede de efluentes que tem tomado muita energia dos empresários de uma determinada indústria. Questões interdisciplinares que envolvem Direito Público, Civil, Contratual, Imobiliário, de vizinhança...

Se o seu caso for então de assédio por estrangeiros, a burocracia aumenta. Há cuidados essenciais sem os quais o sócio jamais poderá repatriar capital ou remeter dividendos ao seu país de origem...

Mas se o caso for uma aquisição por um fundo de private equity ou venture capital não se assuste, regozije-se! O Brasil é um dos mercados emergentes mais relevantes atualmente e por isso os gringos estão buscando cada vez mais a participação em empresas nacionais. Há um grande fluxo de capitais direcionado ao Brasil e isso ainda vai durar, pelo menos até 2016, acredito eu.

Se você viver ou está vivendo uma situação dessas, tenha presente que essa operação, bem conduzida por uma assessoria jurídica completa, possibilitará limitar as responsabilidades das partes envolvidas, implicará em menos garantias de parte a parte, mais transparência nas informações e, por via de consequência mais segurança a todos, poupando argumentos de barganha que, muitas vezes, mais desgasta a outra parte do que beneficia quem barganha. Atualmente, esse fundos tem aceito inclusive aquisições de parte minoritárias, valorizando os gestores que estão no comando. Excelente, não é?

E, se você quiser colocar uma cereja nesse peru (escrevo este artigo às vésperas do Natal...) que tal uma cláusula arbitral? Dessa forma, as disputas que surgirem sobre a operação poderão ser resolvidas por arbitragem, com segurança e sem temor de entravas, custos, burocracias, perícias, audiências, aproveitando toda a simplicidade, sigilosidade, celeridade e tecnicidade que esse meio de resolução de conflitos oferece.

Bons negócios!
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*Sócio do escritório Araújo e Policastro Advogados, especializado em Direito Empresarial

Fonte: Migalhas

Aprovação em concurso público dentro do número de vagas anunciadas gera direito à nomeação

Na discussão que envolve o direito de nomeação de candidatos aprovados em concurso público no regime celetista, a maioria dos magistrados que atuam na Justiça do Trabalho mineira têm entendido que, uma vez publicado o número de vagas no edital, o candidato aprovado dentro desse limite tem direito à nomeação. Isso porque a nomeação dos aprovados é um ato vinculado, ou seja, a lei estabelece que, preenchidas certas condições, a Administração Pública deve agir de determinada forma, sem liberdade de escolha. As regras do edital de concurso público vinculam tanto o concursando quanto o ente público que o lançou. Ao anunciar publicamente a existência de uma vaga para determinado cargo efetivo, abrindo concurso com a finalidade de preenchê-la, a Administração Pública obriga-se a nomear o candidato aprovado e classificado em 1º lugar. Nessa circunstância, não ocorre mera expectativa de direito à nomeação, mas sim direito subjetivo a ela. Ao julgar uma ação que versava sobre a matéria, ajuizada perante a Vara do Trabalho de Aimorés, o juiz titular Leonardo Passos Ferreira adotou esse posicionamento.

De acordo com os dados do processo, o reclamante foi aprovado em 2º lugar para o cargo de Operador de ETA (Estação de Tratamento de Água), no concurso público realizado pelo SAAE ¿ Serviço Autônomo de Água e Esgoto. No edital do concurso havia a previsão de uma vaga para o cargo de Operador de ETA, que não foi preenchida. O 1º classificado no concurso, através de declaração devidamente assinada, desistiu expressamente da vaga antes de ser nomeado. Segundo a tese da autarquia municipal, o reclamante não tem direito à nomeação, pois o edital previa apenas uma vaga e ele foi aprovado em 2º lugar, sendo que o 1º colocado no concurso não poderia desistir de sua nomeação, porque sequer foi nomeado. A reclamada acrescentou ainda que a data de nomeação de candidatos aprovados em concurso público fica a critério da Administração, de acordo com a conveniência e oportunidade administrativa. Portanto, o reclamante, no entender da autarquia, teria apenas mera expectativa de direito.

Discordando desses argumentos, o juiz ressaltou que, se a autarquia previu expressamente no edital do concurso a existência de uma vaga para o cargo de operador de ETA, ficou evidenciada, naquele momento, a sua necessidade de um empregado que exercesse essa função, ou seja, a publicação do edital com o anúncio da vaga já foi suficiente para demonstrar a necessidade e a conveniência do provimento do cargo. A partir de então, o ente público se vincula a seu ato, isto é, tem que preencher a vaga que expressamente declarou existir em seus quadros. Na visão do julgador, a omissão da autarquia em nomear um candidato, agora posicionado em 1º lugar, é ilegal e ofensiva à moralidade administrativa.

Como o candidato aprovado em 1º lugar desistiu da sua nomeação no dia 14/07/2009, o magistrado entende que, a partir do dia seguinte a essa data, o reclamante passou a ser o primeiro na lista para nomeação. Por esses fundamentos, o juiz sentenciante, acolhendo o pedido formulado pelo trabalhador, determinou a nomeação do mesmo para o cargo de operador de ETA, bem como condenou a autarquia ao pagamento de uma indenização correspondente à remuneração mensal do cargo, para cada período de 30 dias, a partir de 15/07/2009, até a efetiva nomeação do concursado. A sentença foi confirmada pelo TRT mineiro.

(nº 00392-2009-045-03-00-8)

Fonte: TRT da 3ª Região

Reajuste abusivo caracteriza ônus ao consumidor

O reajuste abusivo e desproporcional das mensalidades do plano de saúde caracteriza onerosidade excessiva ao consumidor, impondo-se a revisão das respectivas cláusulas abusivas de forma a adequar o equilíbrio econômico-financeiro da relação contratual. Diante desse entendimento, a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso ratificou decisão do Juízo da Comarca de Tangará da Serra (239km a médio-norte de Cuiabá) e não acolheu recurso interposto pela Unimed Vale do Sepotuba, que pretendia reajustar o contrato firmado com a recorrida em 49,98% (Agravo de Instrumento nº 110549/2010 110549/2010).

Consta dos autos que os reajustes das mensalidades do contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares firmado entre as partes, referentes a 2007, 2008 e 2009, foram, respectivamente, de 11,69%, 5,48%e 6,76%. No entanto, o reajuste imposto pela agravante para 2010 foi de 49,98%, constituindo medida desproporcional que importa em onerosidade excessiva para o consumidor.

Sustentou o relator, desembargador Orlando de Almeida Perri, que a aplicação do índice de reajuste de 49,98% colocou os usuários em inegável desvantagem contratual e desequilíbrio econômico, especialmente considerando o fato de que a inflação acumulada do período 2009/2010 não ultrapassou 5%. "As remunerações dos usuários dos planos de saúde não tiveram aumentos superiores aos índices inflacionários e a justificativa dos reajustes baseados apenas na suposta majoração da sinistralidade é ilegal e abusiva", ressaltou o relator.

A apelante argumentou, sem êxito, que o reajuste proposto para o ano de 2010, de 49,98%, é justificado pelo alto grau de sinistralidade do contrato firmado com a agravada. Alegou ainda que a legislação pertinente da Agência Nacional de Saúde (ANS) autorizaria o reajuste anual dos contratos de planos de saúde, bem como a cláusula 15.6 do instrumento firmado com a recorrida, de forma a manter o equilíbrio econômico-financeiro do acordo.

O voto do relator foi acompanhado pelo desembargador Guiomar Teodoro Borges (primeiro vogal) e pelo juiz Alberto Pampado Neto (segundo vogal).

Fonte: TJ/MT

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Planos de Saúde: a busca do STJ pela efetividade dos direitos do consumidor

O direito à saúde foi reconhecido internacionalmente em 1948, quando da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos pela Organização das Nações Unidas (ONU). No Brasil, esse direito é assegurado pela Constituição Federal de 1988 que, em seu artigo 196, preceitua: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.

No texto constitucional, a saúde passou a integrar o Sistema de Seguridade Social. Instituiu-se o Sistema Único de Saúde (SUS), um sistema de atenção e cuidados que não consegue ser suficiente para a efetivação do direito à saúde a toda a população. Assim, milhões de brasileiros buscam os serviços de planos e seguros de saúde para poder obter o “verdadeiro” acesso a essa garantia constitucional a um custo compatível com o nível de renda de cada um.

Entretanto, verifica-se que inúmeros planos de saúde adotam práticas abusivas em relação ao cidadão-consumidor, como a limitação de internações e consultas, a proibição de alguns procedimentos, a rescisão de contrato em razão da sua alta sinistralidade, entre outros. Diante dessa realidade, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem atuado quando as condutas dos fornecedores de planos e seguros de saúde violam o direito básico do consumidor, aplicando, por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor (Súmula 469) para fazer valer os direitos dos segurados ou para manter o equilíbrio dessa relação.

A Súmula 469 do STJ consolida o entendimento, há tempos pacificado no Tribunal, de que “a operadora de serviços de assistência à saúde que presta serviços remunerados à população tem sua atividade regida pelo CDC, pouco importando o nome ou a natureza jurídica que adota” (Resp 267.530).

O CDC é aplicado aos planos de saúde mesmo em contratos firmados anteriormente à vigência do código, mas que são renovados após sua vigência. De acordo com o voto da ministra Nancy Andrighi, no precedente, não se trata de retroatividade da lei. “Dada a natureza de trato sucessivo do contrato de seguro-saúde, o CDC rege as renovações que se deram sob sua vigência, não havendo que se falar aí em retroação da lei nova”, assinalou.

Limitações nos planos

O STJ tem entendimento reiterado no que diz respeito à limitação do tempo de internação. A Quarta Turma, quando do julgamento do Resp 361.415, declarou nula cláusula contratual dos planos de saúde que limita o tempo de internação em UTI. Tal reconhecimento, porém, não implicou, no caso, pagamento de indenização por danos morais e materiais.

O caso envolvia o pedido de um segurado do Rio Grande do Sul contra a Unimed Ijuí Cooperativa de Trabalho Médico. Ele buscava a condenação pelo dissabor na cobrança pelos dias de internação da esposa, que faleceu em decorrência de um acidente automobilístico. A paciente ficou internada durante 47 dias e o contrato do plano de saúde previa a permanência do segurado em UTI por apenas 10 dias, período não cumulável ano a ano.

O relator, ministro Luis Felipe Salomão, esclareceu que não foi possível atender o pedido de indenização, no caso, porque a recusa da empresa de saúde não foi materializada por nenhum ato concreto. A seguradora teria se limitado a prestar informações de que o plano de saúde não cobria internações em UTI superiores a 10 dias. Segundo o ministro, o autor também não teria experimentado prejuízo pecuniário pela internação. Apenas teria recebido uma “cobrança” amigável do hospital.

Em outro julgamento (Resp 326.147), a Quarta Turma decidiu que os planos de saúde não podem limitar o valor do tratamento e de internações de seus associados. Acompanhando o voto do relator, ministro Aldir Passarinho Junior, a Turma concluiu que a limitação de valor é mais lesiva que a restrição do tempo de internação vetada pela Súmula 302 do Tribunal.

Segundo o ministro, a exemplo da limitação do tempo de internação, quando se restringe o valor do custeio, independentemente do estado de saúde do paciente segurado, esvazia-se o propósito do contrato, que é o de assegurar os meios para a sua cura. Para ele, está claro que limitar o valor do tratamento é lesivo ao segurado, pois reduz a eficácia do tratamento.

Reajustes

O STJ, repetidamente, recebe recursos que discutem a abusividade nos reajustes dos planos e seguros de saúde, principalmente quando há mudança de faixa etária. A Terceira Turma, ao julgar o Resp 989.380, vedou os reajustes nas mensalidades dos planos de saúde da Unimed Natal a partir de janeiro de 2004, em razão da mudança de faixa etária daqueles que completassem 60 anos ou mais, independentemente da época em que foi celebrado o contrato, permanecendo os consumidores idosos submetidos aos demais reajustes definidos em lei e no contrato.

Para a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, o consumidor que atingiu a idade de 60 anos, quer seja antes da vigência do Estatuto do Idoso, quer seja a partir de sua vigência, está sempre amparado contra a abusividade de reajustes das mensalidades dos planos de saúde com base exclusivamente na mudança de faixa etária, por força da proteção oferecida pela lei, agora confirmada pelo Estatuto.

A ministra Nancy Andrighi aplicou o mesmo entendimento ao julgar caso envolvendo um grupo de associados da Associação Paulista de Medicina (APM) e da SulAmérica Seguro Saúde S/A (Resp 1.106.557).

Os associados alegaram que a APM enviou-lhes uma correspondência avisando que o plano de saúde não renovaria as suas apólices coletivas por causa da alta sinistralidade do grupo, decorrente de maior concentração dos segurados nas faixas etárias mais avançadas. Informou, ainda, que eles deveriam aderir à nova apólice de seguro, que prevê aumento de 100%, sob pena de extinção da apólice anterior. A ministra considerou ilegítima a rescisão.

Cobertura

A cobertura assistencial é um conjunto de direitos a que o consumidor faz jus ao contratar um plano de saúde. A extensão da cobertura é determinada pela legislação de saúde suplementar e tem que estar expressa no contrato firmado com a operadora. Entretanto, muito se tem discutido, na Justiça, sobre o que deve ser coberto ou não pelos planos de saúde.

Para os ministros da Terceira Turma do STJ, a cirurgia plástica para a retirada do excesso de pele (tecido epitelial) decorrente de cirurgia bariátrica (redução do estômago) faz parte do tratamento de obesidade mórbida e deve ser integralmente coberto pelo plano de saúde (Resp 1.136.475).

O relator do processo, ministro Massami Uyeda, concluiu que esta cirurgia não pode ser classificada como mero tratamento de rejuvenescimento ou de emagrecimento com finalidade estética, procedimentos expressamente excluídos de cobertura, nos termos do artigo 10 da Lei n. 9.656/1998. “É ilegítima a recusa da cobertura das cirurgias destinadas à remoção de tecido epitelial, quando estas se revelarem necessárias ao pleno restabelecimento do segurado acometido de obesidade mórbida”, ressaltou o ministro.

Ainda sobre cirurgia bariátrica, os ministros da Turma determinaram que um plano de saúde arcasse com as despesas da cirurgia em uma paciente que mantinha contrato de seguro anterior ao surgimento dessa técnica de tratamento (Resp 1.106.789).

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou que deve ser proporcionado ao consumidor o tratamento mais moderno e adequado, em substituição ao procedimento obsoleto previsto especificamente no contrato. Ela observou que havia uma cláusula contratual genérica que previa a cobertura de cirurgias “gastroenterológicas”.

De acordo com a ministra, se o contrato previa a cobertura para a doença, qualquer constatação de desequilíbrio financeiro a partir da alteração do tratamento dependeria de uma comparação entre os custos dos dois procedimentos. Para a relatora, sem essa comparação, é apenas hipotética a afirmação de que a nova técnica seria mais onerosa.

Noutro caso, em janeiro de 2010, a Amil Assistência Médica Internacional Ltda. foi condenada ao pagamento integral de todos os gastos havidos até janeiro de 2002, relativamente aos transplantes autólogos (quimioterapia com resgate de células-tronco) realizados por um beneficiário (Resp 1.092.127). O julgamento foi realizado pela Terceira Turma.

O segurado ajuizou a ação sustentando que, após uma internação e um procedimento de coleta de células-tronco, em março de 2000, o plano se recusou a cobrir a continuidade do tratamento, pois foi alegado que o resgate de células-tronco era procedimento equiparado a transplante e, nessa qualidade, não estaria coberto pela apólice.

Indenização

Uma segurada do plano de saúde Unimed – Cooperativa do Trabalho Médico de Santa Catarina também teve garantida pelo STJ indenização por danos materiais e morais decorrentes da falta de cobertura de um enxerto ósseo. As instâncias inferiores haviam entendido que, no caso, caberia apenas a reparação material pela falta de cobertura, já que não houve ato ilícito por parte da seguradora. A Terceira Turma do Tribunal, no entanto, concedeu também o dano moral baseado na existência do dano e não de uma suposta conduta ilícita por parte da seguradora. O enxerto ósseo não constava de previsão contratual (Resp 1.096.560).

No caso, a segurada fez uma cirurgia para remoção de um tumor ósseo, com implantação de enxerto no lugar do tecido removido. O custo do enxerto era de R$ 325 e a recusa da Unimed em cobrir o procedimento fez com que ela recorresse à Justiça.

A Terceira Turma ponderou, no julgamento, que, se uma conduta é ilícita para fins de reparação por dano material, será ilícita também para a avaliação do dano moral. “O que pode acontecer é que, apesar de ilícita, o mero descumprimento de uma cláusula contratual não gere, para parte, qualquer dano moral indenização”, ressaltou a ministra Nancy Andrighi em seu voto, acompanhando o relator, ministro Sidnei Benetti. A Unimed foi condenada ao pagamento de reparação por danos morais no valor de R$ 3 mil.

Em outra decisão, a Turma condenou um plano de saúde a pagar indenização de R$ 10 mil por danos morais a uma segurada que se submeteu a cirurgia de urgência para retirada de vesícula biliar. Aconteceu que, três dias após a operação, o plano de saúde negou-se a cobrir as despesas (Resp 1.072.308).

“A jurisprudência deste Tribunal vem reconhecendo que a recusa indevida à cobertura médica é causa de danos morais, pois agrava o contexto de aflição psicológica e de angústia sofrido pelo segurado”, disse a ministra Nancy Andrighi. Pesou, ainda, contra a seguradora, a circunstância de que a negativa de cobertura, além de ilegal, aconteceu após a realização da cirurgia, quando a paciente estava em recuperação e, de repente, se viu envolvida pelas preocupações com a conta do hospital.

Permanência no plano

O STJ negou o pedido de um ex-funcionário do Banco do Brasil que havia se demitido e, mesmo assim, ingressou com ação judicial para permanecer vinculado, juntamente com seus dependentes, ao plano coletivo de assistência à saúde (Resp 1.078.991).

O julgamento baseou-se em voto do ministro Massami Uyeda, relator do processo. De acordo com o ministro, o direito de manter a condição de beneficiário nas mesmas condições de que gozava quando era funcionário ativo do banco, somente está previsto para os casos em que o empregado é demitido ou exonerado sem justa causa.

Aplicando este entendimento, a Terceira Turma manteve a decisão que determinou à Cassi a reinclusão de ex-funcionário da instituição no plano de saúde. Segundo a Turma, o artigo 30 da Lei n. 9.656/98 não depende de outra norma para ser aplicado. O artigo torna possível a continuidade de ex-funcionário, dispensado sem justa causa, em plano de saúde privado, desde que assumisse o pagamento da parcela patronal (Resp 820.379).

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Fonte: STJ

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Tabela Price viola Lei de Usura e súmula do Supremo

* André Zanetti Baptista

Aproveitando a complexidade da matéria para multiplicar o lucro em detrimento daqueles que vão à busca de empréstimo, as instituições financeiras utilizam ilegalmente, em inúmeros contratos de crédito aperfeiçoados com seus clientes, a denominada “Tabela Price”. A escolha deste nome seria uma homenagem prestada ao matemático inglês Richard Price [1], o qual inseriu nos sistemas de amortizações a teoria dos juros compostos [2].

O leitor perceberá claramente que a curiosa homenagem brasileira feita a Price seria, unicamente, para encobrir a verdadeira demoninação que o próprio Richard Price deu às suas tabelas: Tables of Compound Interest ou Tabelas de Juro Composto [3], pois se fossem conhecidas como o próprio criador as denominou seriam imediatamente proibidas no Brasil pela Lei de Usura (Decreto 22.626/33) e pela Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal.

Sua origem histórica data do final do século XVIII, época em que o mercantilismo, resultado das descobertas marítimas de Portugal e Espanha, estava superado pelo início da Revolução Industrial na Inglaterra e pelas transformações ideológicas consequentes da Revolução Francesa. De um lado, Adam Smith propunha um modelo de progresso e riqueza essencialmente focado no mercado e na divisão do trabalho. De outro, Montesquieu, Voltaire e Rousseau compunham a fonte iluminista inspiradora da liberdade propulsora do ascendente modelo burguês. Desabrochava uma nova dinâmica mundial!

Neste contexto, mais precisamente em 1771, foi publicada mais uma obra de Richard Price sob o título Observations On Reversionary Payments (Observações Sobre Pagamentos Reversíveis). Dentre outros temas de grande importância, aborda o estudo específico sobre o sistema de amortização batizado no Brasil de “Tabela Price”.

Conhecida internacionalmente como “sistema de amortização francês”, já que se desenvolveu efetivamente na França, no século XIX, a tabela de Richard Price consiste na elaboração de um plano de amortização da dívida em parcelas periódicas, iguais e sucessivas, em que o valor de cada prestação é formado por duas partes distintas a saber, uma parte para pagamento de juros e a outra de capital, denominada também de “amortização” [4].

O objetivo de Richard Price foi elaborar um sistema de amortização em que os juros fossem aplicados de forma composta, capitalizando-os mensalmente (período/período), como forma de remuneração do capital, pois sua finalidade era estabelecer um método de pagamento para seguro de vida e aposentadorias. Em outras palavras, a Tabela Price foi criada exatamente para inserir os juros compostos nos sistemas de amortização.

Segue a fórmula [5] da tabela: R = P { [ ( 1 + i )n x i ] / [ ( 1 + i )n – 1 ] }
Onde: P = principal ou capital inicial; R = prestações ou parcelas; i = taxa de juros; n = prazo (exponencialmente considerado).

Constata-se na transcrita fórmula a expressão (1 + i)n, denominada de fator de capitalização ou fator de acumulação de capital, a qual gera comportamento exponencial em função do tempo, característico dos juros compostos, evidenciando o êxito do matemático inglês na inserção da teoria dos juros compostos nos sistemas de amortização.

Se ainda existem dúvidas quanto à capitalização de juro composto, via Tabela Price, a obra de seu criador termina de vez com a polêmica da questão, pois o próprio Richard Price escreve de forma claríssima em seu livro, utilizado por mim, incisivamente, como instrumento de confissão, de que suas tabelas são de juro composto. Logo, diante de tais provas, ninguém poderá dizer que a Tabela Price não possui o componente ilegal do juro composto, sinônimo de anatocismo, sob pena de contrariar o autor dos escritos [6].

Em tal sistema, as parcelas são compostas de um valor referente aos juros calculados sobre o saldo devedor e outro referente a amortização do capital[7]. Desta forma, em cada prestação, parte corresponde aos juros calculados sobre o saldo anterior e outra se destina à amortização parcial deste saldo anterior ou capital principal [8].

Em sua essência, o sistema de amortização francês convencional constitui-se em pagamento de parcelas constantes por possuírem valores iguais, cuja variação dependerá apenas de atualização monetária, periódicas por possuírem lapsos temporais de capitalização iguais, postecipadas por possuírem vencimentos ao final de cada termo e imediatas por não possuírem período diferido, compostas sempre de quotas de amortização crescentes e quotas de juros decrescentes [9]. O problema fica restrito ao cálculo das quotas de amortização do capital, dos juros sobre o saldo devedor e dos saldos devedores. Apesar de fixo, o valor das parcelas (R ou PMT) é a principal variável do sistema francês, pois define quanto o consumidor paga e o quanto a instituição financeira recebe, bem como define a taxa interna de retorno da operação creditícia.

Em virtude das parcelas serem de igual valor e os juros incidirem sobre o saldo devedor, conforme as parcelas são pagas: a) as quotas de amortização do capital aumentam; b) os saldos devedores diminuem; c) as quotas de pagamento de juro diminuem. Neste ensejo, pelo sistema francês de amortização, o devedor compromete-se a pagar periodicamente uma importância, utilizada para liquidar os juros produzidos pelo saldo devedor durante aquele lapso temporal e amortizar uma parte deste saldo de maneira que, no final do prazo estipulado, a dívida se reduza a zero [10].

Pergunta-se: como há capitalização mensal se há o pagamento mensal dos juros produzidos em cada período? Observe na tabela o exemplo do sistema francês de amortização no empréstimo de R$ 1.000 para ser pago em 12 meses e taxa de juro mensal de 3,5%:



Constata-se claramente a utilização da Tabela Price, enquanto manobra matemática, para ludibriar a cobrança de juros capitalizados mensalmente, pois se parte do valor da prestação liquidar os juros acumulados naquele mês (R$ 35) e o restante (R$ 68) amortizar o capital devido (R$ 1.000), ter-se-á o mesmo resultado numérico de se amortizar o capital com a parcela total (R$ 1.000 – R$ 103 = R$ 897) e capitalizar os juros produzidos naquele período (R$ 897 + R$ 35 = R$ 932).

Portanto, a Tabela Price é utilizada para ludibriar a cobrança de juros compostos, capitalizados mensalmente, pois o pagamento mensal dos juros causa a diminuição do valor a ser amortizado na dívida principal, consequentemente, o saldo devedor sobre o qual incide a taxa de juro do mês seguinte deixa de diminuir o montante dos juros pagos no mês anterior, capitalizando-os a cada incidência da taxa de juro sobre o saldo devedor, pois este foi indevidamente amortizado ou ilegalmente acrescido de juros mensais.

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[1] Samuel Hazzan e José Nicolau Pompeo. Matemática financeira. São Paulo: Atual, 1993, pág. 161.

[2] Mario Geraldo Pereira. Plano básico de amortização pelo sistema francês e respectivo fator de conversão, dissertação apresentada na Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo, 1965, pág. 176.

[3] José Jorge Meschiatti Nogueira. Tabela Price – Da prova documental e precisa elucidação do seu anatocismo. Campinas: Servanda, 2002, pág. 22.

[4] Mario Geraldo Pereira. Plano básico de amortização pelo sistema francês e respectivo fator de conversão, dissertação apresentada na Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo, 1965, pág. 176.

[5] Luiz Antônio Scavone Junior. Juros no direito brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pág. 164.

[6] José Jorge Meschiatti Nogueira. Tabela Price – Da prova documental e precisa elucidação do seu anatocismo. Campinas: Servanda, 2002, pág. 168/169.

[7] Luiz Antônio Scavone Junior. Juros no direito brasileiro, São Paulo: Resvista dos Tribunais, 2003, pág. 161.

[8] Paulo Eduardo Razuk. Dos juros, dissertação apresentada na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre, 2003, pág. 49/50.

[9] Edison Fernandes Pólo. Engenharia das operações financeiras, São Paulo: Atlas, 1996, pág. 203.

[10] José dos Santos Moreira. Matemática comercial e financeira, São Paulo: Atlas, 1967, pág. 124.

* André Zanetti Baptista É advogado do escritório Simões Caseiro Berbel & Guimarães Nunes Advogados, mestre em Direito Civil Comparado pela PUC-SP, professor assistente de Direito Penal, Comercial e Civil na PUC-SP, professor de Direito Civil e Prática Forense na Universidade Anhanguera Unidade Brigadeiro, professor palestrante do Instituto Paulista de Educação Continuada, da Cursos Jurídicos Lex, da Pós-Graduação do Curso Êxito em São José dos Campos e Campinas, da Pós-Graduação do Complexo Jurídico Damásio de Jesus e da Pós-Graduação da Escola Superior de Advocacia.

Fonte: Conjur

Precatórios. Suspensão do art. 78 do ADCT. Consequências

* Kiyoshi Harada

O art. 2º da EC nº 30, de 13-9-2000, inseriu o art. 78 ao ADCT possibilitando o pagamento parcelado em até 10 parcelas anuais iguais e sucessivas, tanto para os créditos pendentes de pagamento na data da promulgação dessa Emenda, quanto para os créditos que vierem a ser gerados por ações judiciais iniciadas até o final do ano de 1999.

O § 2º, do art. 78 ,do ADCT prescreveu que as parcelas anuais, se não liquidadas até o final do exercício a que se referem, terão poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora.

O art. 2º, da EC nº 30/2000, que introduziu o art. 78 do ADCT, foi objeto de ADIs de ns. 2356 e 2362 ajuizadas pela CNI e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

O Relator dessas ADIs, Min. Néri da Silveira, em 18-2-2002, deferiu a media liminar para suspender até o julgamento do mérito a eficácia do art. 2º da EC nº 30/2009. Após os votos dos Ministros Elen Gracie, Eros Grau, Joaquim Barbosa, Dias Tóffoli, Ricardo Lewandowiski, Ayres Britto e Gilmar Mendes houve empate na votação (5 votos a 5) aguardando o voto do Ministro Celso de Mello, desde 10-2-2010.

Na sessão plenária do dia 25-11-2010 o Min. Celso de Mello proferiu seu voto aderindo ao voto do Relator. Com isso a eficácia do art. 2º, da EC nº 30/2000 ficou suspensa até o julgamento definitivo do mérito. Considerando os dez anos decorridos desde a propositura das ADIs poderia ter sido julgado diretamente o mérito.

Quais as conseqüências desse julgamento?

a) A suspensão de eficácia do art. 2º, da EC nº 30/2009 sinaliza idêntico resultado no julgamento da ADI nº 4357 ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil que ataca a EC nº 62/2009, conhecida como emenda do calote, pois ela padece dos mesmos vícios de inconstitucionalidade do art. 2º da EC nº 30/2000 por afronta aos princípios da coisa julgada, da independência e harmonia dos Poderes e da segurança jurídica. Posteriormente, outras duas ADIs foram ajuizadas por outras instituições.

b) As parcelas anuais pendentes de pagamento poderão ensejar pedido de intervenção federal nos Estados e intervenção estadual nos Municípios, pois essas dívidas deveriam ter sido pagas até o final do exercício seguinte ao das respectivas inclusões orçamentárias dos condenações requisitadas tempestivamente.

Os precatórios alimentícios, ironicamente prejudicados em função do privilégio de que gozam, também, podem ensejar pedidos de intervenção. Como se sabe, os credores alimentícios foram preteridos pelos credores de precatórios comuns, sem privilégios, em função do poder liberatório concedido pelo § 2º, do art. 78 do ADCT relativamente às parcelas anuais inadimplidas, sem prejuízo de seqüestro. Em razão dessas sanções os governantes preferiram pagar os não privilegiados e congelar a fila de precatórios privilegiados.

O Município de São Paulo, por exemplo, nem terminou de pagar os precatórios alimentares do exercício de 2001, não por falta de recursos financeiros, mas pela opção política de não pagar. O exame das contas do Executivo do exercício de 2009 sob julgamento pela Câmara dos Vereadores revela os seguintes dados estarrecedores: a) foi requisitado pelo Tribunal para aquele exercício R$ 1,5 bilhões e a Prefeitura incluiu apenas R$ 830 milhões e pagou somente R$ 112 milhões, ou seja, 1,04% da dívida, enquanto a Prefeitura mantinha aplicado no mercado financeiro R$ 3,7 bilhões auferindo rendimento de R$ 370 milhões. Enquanto isso centenas de credores morreram na fila de precatórios, alguns deles, até por falta de assistência médica como decorrência do calote. A Prefeitura cometeu, pois, ato ilícito ao teor do art. 186 do CC, legitimando os prejudicados a ingressar com ação de indenização contra o Município. Quando o descumprimento de precatório assume a característica de algo planejado e programado, mediante esvaziamento sistemático das verbas consignadas ao Judiciário, como vem acontecendo no Município de São Paulo, o atentado ao princípio da moralidade pública é de tal ordem que somente o uso da via interventiva será capaz de colocar nos trilhos a administração municipal mediante afastamento de seu governante.

c) A tese da compensação de precatório alimentar com tributos da entidade política devedora perde base constitucional, pois toda ela estava ancorada na interpretação ampla do § 2º, do art. 78, do ADCT, que dispunha sobre o poder liberatório dos precatórios sob moratória, nas hipóteses de descumprimento das parcelas anuais.

A menos que se busque novo fundamento para sustentar o poder liberatório do precatório descumprido é provável que o STF julgue prejudicado o RE nº 566349-MG, onde discute duas questões: a) autoaplicabilidade do § 2º, do art. 78 da ADCT; b) extensão do poder liberatório de pagamento de tributo da entidade devedora aos precatórios de natureza alimentícia.

Se for considerar que a Corte Suprema decidiria pela extensão do poder liberatório dos precatórios alimentares é de se concluir que o julgamento do STF favorece, de um lado, os precatoristas à medida que sinaliza julgamento favorável na ADI que discute a inconstitucionalidade da EC nº 62/2009, mas, de outro lado, torna a sustentação da tese da compensação de precatório com tributos de entidade devedora bem mais difícil, senão impossível por ausência de matriz constitucional.

* Jurista, com 22 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
Site: www.haradaadvogados.com.br
E-mail: kiyoshi@haradaadvogados.com.br

Fonte: Revista Contábil & Empresarial Fiscolegis, 10 de Janeiro de 2011.

Funcionário público: STJ - Desconto de empréstimo em folha não deve ultrapassar 30% dos vencimentos

A soma mensal das prestações referentes às consignações facultativas ou voluntárias, como empréstimos e financiamentos, não pode ultrapassar o limite de 30% dos vencimentos do trabalhador. Essa foi a decisão da 3ª turma do STJ ao atender o recurso de uma servidora pública gaúcha contra o Banco Santander Banespa S/A, que aplicava um percentual próximo dos 50%.

A servidora ajuizou ação contra a instituição financeira para limitar os descontos em folha de pagamento, decorrentes de empréstimos consignados, a 30% da remuneração. Em primeira instância, o pedido foi negado. A 15ª câmara Cível do TJ/RS rejeitou a apelação por unanimidade, pois entendeu que o desconto era regular e que só deve haver limitação quando a margem consignável for excedida.

No recurso especial, a mulher sustentou que havia omissão e contradição no acórdão do TJ/RS. Alegou ainda que o entendimento do TJ/RS diverge da jurisprudência de outros tribunais, que determinam a limitação dos descontos em folha em 30%, devido ao caráter alimentar e ao princípio da razoabilidade.

O relator, ministro Massami Uyeda, afastou a alegação de que o acórdão do TJ/RS foi omisso ou contraditório por considerá-la genérica. O ministro observou que não houve indicação clara dos pontos contestados, incidindo por analogia a súmula 284/STF.

Quanto à porcentagem do desconto, o ministro apontou que a divergência jurisprudencial ocorre entre o TJ/RS, que admitiu o desconto próximo de 50% da renda da mulher, e o TJ/SP, que determinou que o percentual máximo de abatimento era de 30%.

O ministro argumentou que "deve-se levar em consideração a natureza alimentar do salário e o princípio da razoabilidade" para atingir o equilíbrio entre os objetivos do contrato firmado e a dignidade da pessoa. Com isso, "impõe-se a preservação de parte suficiente dos vencimentos do trabalhador, capaz de suprir as suas necessidades e de sua família, referentes à alimentação, habitação, vestuário, higiene, transporte, etc.", complementou.

O relator esclareceu ainda que a lei 10.820/03, que dispõe sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento, e o decreto 6.386/08, regulamento do art. 45 da lei 8.112/90, que trata da consignação em folha de pagamento dos servidores públicos, determinam que a soma mensal das prestações destinadas a abater os empréstimos realizados não deve ultrapassar 30% dos vencimentos do trabalhador.

Processo Relacionado: Resp 1186965 - clique aqui.

Fonte: Migalhas

Mantidas regras de dedutibilidade de ágio

* Fabio Tadeu Ramos Fernandes

** Melina Joice Fioravante

Como se sabe, tradicionalmente, a chegada do fim de ano traz (além do clima de festas), as mais diversas alterações na legislação tributária. Em 2010, no entanto, a surpresa foi a manutenção em geral das regras atuais em matéria de tributos.

Um dos temas que causam ou causavam mais temor ao empresariado e investidores internacionais trata-se especificamente da dedutibilidade do ágio para fins tributários.

Desde o início do ano de 2010, com a obrigatoriedade de adequação às novas normas brasileiras de contabilidade, as chamadas regras da IFRS (International Accounting Standards Board), há no mercado uma expectativa crescente em torno da edição de uma lei que adeque a seara tributária à contábil.

Não é raro, no Brasil ou no exterior que existam divergências entre normas tributárias e normas contábeis. Nesse contexto se insere a obrigação relativa ao Livro de Apuração do Lucro Real ("Lalur") criada em 1971 para lançamentos de ajuste do lucro líquido, de modo a compatibilizar a escrituração comercial, contábil e fiscal.

Assim, não é surpresa que o ano de 2010 tenha transcorrido sem que a nova disciplina da Lei das Sociedades por Ações ("LSA" - clique aqui), responsável pela veiculação legal nas novas regras contábeis, tenha encontrado respaldo nas normas tributárias. Há de se observar, que desde 2008, o Brasil adota o "Regime Tributário de Transição" ("RTT"), que instituiu a chamada "neutralidade fiscal" para operações ocorridas durante sua vigência.

Em outras palavras, as mesmas regras verificadas hoje já estavam em vigor anteriormente, em que pese não ter se verificado o temor que o aproveitamento do ágio fosse vedado.

Vale esclarecer que, sob o RTT, o ágio já vinha sendo determinado nos moldes aceitos internacionalmente: primeiramente enquadrado dentre os ativos tangíveis e/ou intangíveis, e apenas eventualmente, na hipótese de restar saldo residual do preço de aquisição, caracterizado como rentabilidade futura.

Uma vez que a escrituração contábil não se confunde com a escrituração fiscal, podemos afirmar que para 2011 fica mantido o direito de aproveitamento do ágio tal como estipulado anteriormente no sistema tributário. Assim, investimentos em participações societárias a serem efetuados em 2011 ainda terão por base o direito atual o qual determina a possibilidade de utilização do ágio calculado com base na diferença entre valor de livros e o valor investido, limitado, quando sua justificativa for a rentabilidade futura, em 5 (cinco) anos no mínimo.

É importante ressaltar que, neste cenário, a edição de uma norma atinente ao ágio continua iminente, mas pouco desejável, posto que reduziria a possibilidade de seu aproveitamento tributário.
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*Sócio do escritório Almeida Advogados

**Advogada do escritório Almeida Advogados

Fonte: Migalhas

Novo Código de Processo Civil e o acesso à saúde

* Renata Vilhena Silva

Apesar de a Constituição Federal garantir o acesso universal à saúde, no direito processual repousa a esperança do cumprimento efetivo do preceito constitucional. Isso porque hoje, no Brasil, ocorre o fenômeno da judicialização da saúde, ou seja, o cidadão consegue amparo e dignidade mediante a propositura de ações judiciais.

No Estado de São Paulo, os números assustam. Em recente matéria publicada no jornal O Estado de São Paulo, o então governador José Serra disse que "há uma indústria de ações judiciais" e chamou a operação de "ponta de um barbante de um nó que precisa ser desatado". Em 2009, a secretaria afirma ter investido R$ 1,3 bilhão em remédios, cerca de R$ 400 milhões para cumprir medidas judiciais.

Enquanto as ações judiciais estavam garantindo o cumprimento do texto constitucional, a situação estava sob controle. Pelo menos os que procuravam a Justiça tinham a dignidade garantida. Todavia, estamos experimentando um período dramático, pois nem as decisões judiciais estão merecendo respeito dos governantes. Coincidentemente, a escassez de medicamentos e vagas em hospitais conveniados ao SUS se agravou nesta época de campanha eleitoral.

Advogar para doentes e enfrentar situações como essa gera uma condição de impotência arrebatadora. Presenciar e acompanhar o agravamento da saúde dessas pessoas causa revolta e indignação.

O novo CPC (clique aqui) traz esperança aos doentes e aos advogados da saúde. Um dos preceitos no código são celeridade e segurança jurídica. O projeto pretende introduzir, no sistema processual, mecanismos com vistas a garantir celeridade e segurança na prestação jurisdicional, atribuindo efetividade às decisões, ou seja, pretende garantir que a ordem do juiz realmente surtirá efeito.

Mudanças importantes foram propostas para que as decisões sejam cumpridas com agilidade. Também há previsão de corte significativo dos recursos, serão excluídos do novo código, por exemplo, os Embargos Infringentes e o Agravo Retido. No entanto, deve-se prestar atenção à necessária busca por uma Justiça mais rápida e eficiente, que não poderá violar o exercício das garantias e dos princípios constitucionais, como a ampla defesa e o contraditório, igualmente importantes para os operadores do Direito e para os jurisdicionados.

Conforme a proposta, a unificação dos prazos processuais - seja para interposição de recursos, seja para defesas - passará para 15 dias. A OAB sugeriu a estipulação de prazos para os juízes, cujo cumprimento seria requisito para futura promoção destes, o que privilegiaria os magistrados comprometidos com a adequada prestação jurisdicional.

Esses são apenas alguns pontos importantes trazidos pelo anteprojeto do CPC. Já é possível concluir que a discussão em torno de um novo CPC é, de fato, um marco importante para o judiciário brasileiro, porquanto a morosidade judicial constitui um dos principais motivos para a sensação de impunidade sentida por toda a população. O novo código vem com a promessa de otimizar a realização da Justiça. Dessa maneira, esperamos que promova a Justiça atemporal e apolítica, garantindo o efetivo acesso à saúde e o cumprimento ao princípio da dignidade da pessoa humana.
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*Sócia-fundadora do escritório Vilhena Silva Sociedade de Advogados

Fonte: Migalhas

Acordo judicial não impede ação de indenização

O acordo judicial celebrado antes da Emenda Constitucional nº 45/2004 não impede posterior ação com pedido de indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho ou de doença profissional. Na interpretação da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, até a promulgação da emenda, havia dúvidas sobre a competência para examinar esses processos, ou seja, se cabia à Justiça comum ou trabalhista.

No caso relatado pelo presidente da Turma, ministro Pedro Paulo Manus, um ex-empregado da Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo) firmou acordo em juízo no qual deu quitação total do contrato de trabalho. Posteriormente, apresentou nova ação, desta vez na Justiça comum, com pedido de indenização por danos morais e materiais tendo em vista suposta doença ocupacional.

Como a Codesp foi incorporada pela Turim Equipamentos, as empresas alegaram que era incabível o pedido porque o empregado havia dado quitação plena do extinto contrato. A Vara do Trabalho e o Tribunal Regional de São Paulo julgaram extinto o processo, sem resolução do mérito, por entenderem que se tratava de coisa julgada, ou seja, de pretensão já decidida sem possibilidade de recurso.

No entanto, pela avaliação do ministro Pedro Manus, à época em que o empregado firmou o acordo na Justiça do Trabalho, ainda não tinha entrado em vigor a EC nº 45/2004 – tanto que a ação de reparação foi ajuizada na Justiça comum (só mais tarde os autos foram encaminhados à Justiça trabalhista). Até a emenda, portanto, prevalecia o entendimento de que a competência para examinar situações dessa natureza era da Justiça comum.

Assim, somente com a nova redação dada pela emenda, o artigo 114, IV, da Constituição previu expressamente a competência da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”. O ministro Manus também observou que o Supremo Tribunal Federal, ao decidir a questão, adotou como marco temporal para fixação da competência da Justiça do Trabalho a promulgação da emenda.

Nessas condições, o relator concluiu que não é possível admitir que, por meio do referido acordo, o empregado tenha dado quitação de parcelas que poderiam ser postuladas na Justiça comum. Por consequência, o ministro afastou a declaração de coisa julgada manifestada pelas instâncias ordinárias e determinou o retorno do processo à Vara de origem para analisar o pedido do trabalhador.

Clique aqui para ver o andamento do processo: RR-1601-87.2006.5.02.0442

Fonte: TST

Ausência de notificação impede rescisão contratual de plano de saúde

A ausência de notificação do usuário até o 50º dia da inadimplência, descrita no parágrafo único do artigo 13 da Lei dos Planos de Saúde, impede a suspensão ou rescisão unilateral do contrato por parte operadora de plano de saúde. Com esse entendimento, a 1ª Câmara Cível do TJMT não acolheu o agravo de instrumento, interposto pela cooperativa de trabalho médico Unimed Cuiabá, e manteve decisão que concedera tutela antecipada para determinar que a Unimed restabelecesse imediatamente o plano de saúde de um menor, sob pena de aplicação de multa diária de R$ 1 mil.

No recurso a Unimed alegou que a agravada, mãe do menor, estaria escorando o pedido de obrigação de fazer para que fosse determinada a continuação do plano de saúde cancelado por motivo de inadimplência. Informou que o menor é portador de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), por sequela de má-formação encefálica, e que a própria agravada teria reconhecido na peça inicial que não cumprira corretamente a contraprestação que lhe corresponderia no contrato de saúde firmado com a agravante.

Alegou que em razão da inadimplência correspondente a quatro prestações mensais, solicitou a regularização das mensalidades atrasadas, sendo a notificação remetida ao endereço da agravada, situação que atenderia às exigências da Lei nº 9.656/98. Isso porque teria advertido a usuária de maneira clara acerca do débito pendente, com suas datas de vencimento, bem como prazo para regularizar a situação, o que não foi atendido. Por isso, defendeu a legalidade da rescisão contratual.

Em se voto o relator do recurso, desembargador Guiomar Teodoro Borges, explicou que, do exame das provas, pôde constatar que a inadimplência referente à mensalidade do mês de janeiro de 2010 se deu em 1º de fevereiro de 2010. Mas a notificação apresentada pela cooperativa foi recebida em 4 de maio de 2010, por terceiro estranho à relação contratual originariamente estabelecida entre a operadora do plano de saúde e a usuária, genitora do agravado. “Seja como for, se a notificação foi enviada como assegura a agravante, o certo é que não ocorreu na forma da lei, primeiro, por não estar comprovada a notificação do usuário até o 50º dia de inadimplência, que se deu em 22 de março de 2010 e, segundo, porque recebida por terceiro estranho a relação processual”.

O magistrado salientou, ainda, que o receio de dano irreparável ou de difícil reparação reside no fato do risco de vida do agravado, visto que está devidamente comprovado que o menor necessita de tratamento diário em razão da doença que é portador. “A verossimilhança das alegações do autor, ora agravado, encontra guarida ante o não-preenchimento pela agravante dos requisitos para efetuar licitamente a suspensão ou rescisão unilateral do contrato. Assim, estão preenchidos os requisitos ensejadores à antecipação de tutela”, complementou.

Agravo de instrumento nº 74507/2010

Fonte: TJ/MT